17 de jan. de 2021

Resenha: Bisa Bia, Bisa Bel - Ana Maria Machado.

A história é contada pela própria Isabel, em primeira pessoa, num tom espontâneo que reproduz bem o fluxo do pensamento da protagonista, com leveza e alguns toques de humor, mas com uma delicadeza e ingenuidade capaz de levar às lágrimas o leitor mais sensível. A curiosidade e o estranhamento marcam os títulos dos capítulos – “Pastel bochechuda”, “Tatuagem transparente”, “Trança de gente” – e nos fazem tentar antecipar os acontecimentos.

O livro Bisa Bia, Bisa Bel foi publicado originalmente em 1982, e desde então foram mais de 500 mil exemplares vendidos, além de um rol de prêmios, entre eles o Maioridade Crefisul (1981), o Bienal São Paulo de melhor livro infantil do biênio (1984) e o merecido lugar na Lista de Honra do IBBY (1984). 

Durante uma das arrumações de sua mãe, Isabel toma contato com o passado, por meio dos objetos e fotografias que as duas encontram numa antiga caixinha de madeira. Uma das fotos era da mãe, o que já inquieta bastante a menina.

“Eu olhava para minha mãe e para o retrato da menina, achava meio gozado aquilo, minha mãe criança, brincando no galho de um camelo, pensando em balão d’água. E era meio esquisito, ela grande ali na minha frente, sentada no chão, explicando as coisas” (p. 8).

Mas as coisas se complicam mesmo quando ela se depara com o retrato de sua bisavó, Beatriz. Para surpresa de Isabel, ao tentar colocar a foto no bolso, ela começa a ouvir uma voz – este foi o começo das longas conversas que teria com Bisa Bia, que passaria então a acompanhar a menina na escola e nas brincadeiras, sempre dando conselhos e opiniões, e deixando-a às vezes em situações embaraçosas com os colegas. Mas, afinal,

“Como é que eu podia explicar (…) que Bisa Bia estava existindo agora para mim?”



Sinopse: A menina Bel encontra um dia uma foto de sua bisavó Bel, entre as coisas de sua mãe. A partir daí, ela inicia uma relação de muitas descobertas com essa pessoa tão importante na vida de sua família e na da própria. Até que surge uma menina inesperada. Uma relação de amizade e troca, capaz de emocionar a todos.

Três gerações encontram-se com sensibilidade e poesia nesta verdadeira obra-prima de Ana Maria Machado.



Bisa Bia, Bisa Bel
Ilustrador: Mariana Newlands
Editora: Salamandra
80 páginas




Tive uma ligação quase que "transcendental" com esse livro sou movida a histórias não resolvidas e saudades que vem do nada... Risquei a palavra saudade do meu vocabulário mas esse ano de 2015 essas "saudades" viram a tona com um turbilhão de memórias... Acredito que os livros nos encontram no momento certo. E depois de várias indicações  encontrei essa edição na biblioteca da faculdade na qual dividimos com uma escola...




Bisa Bia, a voz da tradição e de um outro modelo de feminilidade, não apreciava as brincadeiras “de menino” de Isabel, que não eram coisa de mocinha bonita e bem-comportada. Mas, apesar das censuras, o contato com Bisa Bia faz com que a menina conheça coisas de um tempo que já passou – toucador, baba-de-moça –, e a autora faz dessas pequenas descobertas um elemento interessante que apela para a curiosidade e passa longe de um aprendizado puro e simples. Contrapondo-se a Bisa Bia, surge então, num momento-chave para a personagem, Neta Beta, uma outra voz que começa a se intrometer nas conversas apresentando um ponto de vista bastante diferente.

As duas vozes, de Bisa Bia e Neta Beta, acabam fazendo com que Isabel encontre um meio-termo entre as duas maneiras de ser menina e mulher. Nas palavras dela:

“Impossível saber sempre qual o palpite melhor. Mesmo quando eu acho que minha bisneta é que está certa, às vezes meu coração ainda quer-porque-quer fazer as coisas que minha bisavó palpita, cutum-cutum-cutum, com ele… Mas também tem horas em que, apesar de saber que é tão mais fácil seguir os conselhos de Bisa Bia, e que nesse caso todos vão ficar tão contentes com o meu bom comportamento de mocinha, tenho uma gana lá de dentro me empurrando para seguir Neta Beta, lutar com o mundo, mesmo sabendo que ainda vão se passar muitas décadas até alguém me entender. Mas eu já estou me entendendo um pouco – e às vezes isto me basta.” (p. 53)

Este trecho é um exemplo marcante de como Ana Maria Machado encontra-se em harmonia com os sentimentos da pequena leitora, afinal a maioria das meninas, na infância, fica insegura sobre como se comportar, sobretudo diante dos meninos.



Ilustração e projeto gráfico estão em sintonia, e remetem ao próprio clima da narrativa. Suaves e delicadas, parecendo feitas a lápis, em preto de branco, remetem ao passado e à tradição, favorecendo uma apreciação reflexiva do que se vê e lê. As ilustrações, premiadas com o Jabuti em 1984, retratam cenas atuais da personagem, mas também objetos da época de sua bisavó que povoam o imaginário da menina.


O desfecho é emocionante e surpreendente, e a protagonista descobre por si mesma que as três – Isabel, Bisa Bia e Neta Beta – juntas são invencíveis.




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